A Bélgica brasileira fala "uai!"

A Bélgica brasileira fala "uai!"*
Comparadas a excelência das marcas belgas, cervejas artesanais mineiras ganham status de especiaria e conquistam apreciadores

Popularmente, a veia boêmia está no DNA dos mineiros. Prova disso é Belo Horizonte ser reconhecida como a “capital dos bares e botecos”. No entanto, a fabricação de cerveja no estado elevou a bebida fermentada a um patamar especial. Isso porque nos últimos anos Minas Gerais se tornou a mais nova queridinha do mercado cervejeiro, ostentando a honrosa alcunha de ser a “Bélgica brasileira”. O estado tem ganhado os holofotes do setor por produzir cervejas artesanais cujo padrão de qualidade é atestado em premiações internacionais no Brasil e no exterior. Sim, nem só de pão de queijo vivem os mineiros.
Com uma produção mensal de 1,5 milhão de litros, Minas Gerais é o segundo maior produtor brasileiro de cervejas artesanais. De acordo com o Sindicato das Indústrias de Cerveja e Bebidas em Geral do Estado de Minas Gerais (SindBebidas), atualmente o estado concentra 49 microcervejarias. A região campeã é a Grande BH, com 26 empresas especializadas na fabricação da bebida caseira.Mas também há indústrias no Sul de Minas (11), Zona da Mata (7), Triângulo Mineiro (3) e Centro-Oeste (2).


Minas Gerais não tem somente café e leite na sua cartela especial de bebidas. Os mineiros também fabricam (e consomem) cervejas artesanais de alta qualidade (Crédito: Redação Veja BH)

Para o superintendente executivo do SindBebidas, Cristiano Lamêgo, a popularidade conquistada pelas cervejas artesanais advêm da melhora do poder de compra dos brasileiros. “Com o aumento de renda da população nos últimos anos, os consumidores passaram a demandar produtos com maior valor agregado, inclusive a cerveja”, pontua. O representante do sindicato salienta que, embora o crescimento da indústria cervejeira nos últimos anos tenha chegado a 20%, para o ano de 2017 a expectativa é menor. “Em decorrência da crise econômica, estamos prevendo que a produção de cerveja artesanal cresça apenas 14%”, explica.

Além de oferecer uma bebida diferenciada em termos de qualidade, Minas Gerais conta com uma diversidade de rótulos. Segundo Lamêgo, já existem no estado pesquisas voltadas ao desenvolvimento de cervejas com estilo local. “Assim como ocorre na Alemanha e na Bélgica, o intuito é criar um produto que permita uma identificação com a nossa regionalidade. Temos o exemplo da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), que está selecionando leveduras de fermentação da cachaça para a produção de cervejas com características peculiares regionais”, aponta.
Com vista na propensão do mercado, o SindBebidas, junto ao Programa de Competitividade Industrial Regional do Sistema FIEMG, está trabalhando em um projeto de posicionamento estratégico setorial. A proposta da iniciativa é criar uma identidade coletiva para as microcervejarias artesanais mineiras, para que elas sejam capazes de gerar negócios. Ainda na etapa inicial, o projeto realiza um mapeamento do panorama estadual e nacional do setor e centra esforços na definição de um modelo de negócio aplicável a todas as empresas.


Sindbebidas e FIEMG se unem para impulsionar a cadeia produtiva do estado (Crédito: FIEMG)

Potencial turístico

Mais do que fomentar o desenvolvimento econômico do estado, a produção de cervejas artesanais ainda impacta a cadeia turística. Na Região Metropolitana de BH, principalmente em Nova Lima, microcervejarias tem investido na construção de espaços abertos à visitação de turistas. As instalações são um convite para os visitantes que desejam conhecer a produção da bebida e também realizar a degustação de vários tipos do produto. De acordo com a Associação Brasileira da Indústria da Cerveja (CervBrasil) o mercado das bebidas especiais representa 11% de todo o setor cervejeiro.

Veja abaixo o mapa da rota cervejeira, com as fábricas da Região Metropolitana de Belo Horizonte que estão abertas para visitação:


Especialização na academia

Para quem deseja ter contato com a cadeia produtiva de cerveja artesanal e se especializar na produção da bebida, o Centro Universitário de Belo Horizonte (Unibh) oferece há quatro anos o curso de pós-graduação em Tecnologia Cervejeira. A instituição de ensino é uma das primeiras no Brasil a oferecer esse tipo de curso, tendo em vista o advento do mercado nos últimos anos.


Divulgação do curso (Crédito: Unibh)

Segundo Alessandro Perdigão, professor do curso no Unibh, a iniciativa dá ao aluno a oportunidade de profissionalização. “Eles aprendem as técnicas adequadas para se produzir uma cerveja de qualidade, além de noções sobre gestão de microcervejarias. Ou seja, o curso abrange desde a formação do profissional com relação ao conhecimento da cerveja até a entrada dele no mercado, caso seja a sua opção”, pontua.

Qualquer amante de cerveja pode cursar a pós-graduação. De acordo com Perdigão, a iniciativa não é restrita a produtores profissionais. “Entre os estudantes, temos médicos, engenheiros e professores. Essa é uma oportunidade para quem quer investir no mercado cervejeiro”, afirma. Por ano, são três turmas que, em média, concentram entre 40 e 50 alunos.

Perdigão ainda avalia que o título de Minas Gerais como a “Bélgica brasileira”é mais do que justo. “O mineiro tem fama de ser mais recatado. Mas quando o assunto é produção de cerveja, ele se mostra ousado e criativo, assim como os belgas. Além do mais, a amplitude de harmonização da cerveja, em comparação com o vinho, por exemplo, é bem maior. Você pode tomá-la com feijoada, costelinha, comida vegetariana, vegana... O fato de não termos praia valorizou a harmonização das cervejas com a culinária mineira”, expressa.

Bruno Dinali, aluno da pós-graduação, afirma que o curso foi fundamental na realização de networking. “O legal é essa troca de experiências, pois aqui tem tudo: desde cervejeiros veteranos até quem está começando do zero”, opina. Para outro aluno, Alisson Alves, o reconhecimento do curso por profissionais do mercado é um diferencial. Futuramente, ele pretende a própria cervejaria e acredita que os ensinamentos do curso serão essenciais. “Quero me tornar mestre cervejeiro e viver só de cerveja”, visiona.
Preço X Qualidade
O preço das cervejas artesanais faz com que o público consumidor seja mais elitizado e o produto seja restrito a uma fatia do mercado. Alessandro Perdigão explica que o preço da bebida é mais caro quando comparado as cervejas tradicionais pelo fato do processo de produção ser diferenciado e os produtos usados serem de maior qualidade. “É uma questão de valor agregado. O vinho, por exemplo, não se discute o preço, comparando ele com um refrigerante ou outra bebida inferior. Então ele tem seu valor. E o que acontece com as cervejas artesanais é justamente esse processo. Existe um valor agregado junto à produção e produtos utilizados”, observa.

Harmonização

Os apreciadores de cervejas artesanais levam a sério o consumo da bebida. Para cada tipo de cerveja, há um tira-gosto ou petisco adequado para o acompanhamento. Mas antes de se embaralhar, tenha calma! A boa notícia é que não há muito segredo em harmonizar cerveja com comida. O infográfico abaixo te explica tudinho e ainda te ajuda a elevar a moral com a galera do boteco. 

Elaborado por Gabriel Menezes 

Teste Cego: cerveja artesanal X cerveja industrial 



*Reportagem produzida em julho de 2017, em parceria com Caetana Lisboa e Fabíola Costa, para a disciplina de Webjornalismo, do curso de jornalismo do UniBH

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