Uma it girl messiânica

Uma it girl messiânica*

Dona de um sucesso espontâneo, a blogueira Carol Alcântara reflete os prazeres de sua vida no trabalho

Em pé, próxima a uma pilastra da praça de alimentação do Pátio Savassi, lá está ela. Veste um traje profissional: blusa de cetim nude com ombros levemente à mostra, calça jeans clara e sapato preto com salto baixo. O olhar, aparentemente maquiado, se direciona para os lados, à minha procura. Um aceno e ela me vê, sinalizando com um sorriso alvo e largo, reforçando então a impressão simpática a qual tantos destacam.

Após o “rito oficial” de cumprimento, buscamos um lugar para sentar e iniciar a prosa. A escolha não é das mais felizes, já que no entorno há um grupo de adolescentes, estudantes de uma escola particular, que almoçam em tom de algazarra. Aquele falatório, não só vindo dos jovens, mas das demais pessoas que se encontram no momento de refeição, atua como uma espécie de trilha sonora para a entrevista.

- Eu tenho que correr, pois estou no meu horário de almoço e preciso voltar para o serviço.  – adverte, educadamente, a vítima da minha delonga.

- Tudo bem. Prometo ser rápido – digo, com um sorriso amarelo a tal frase de efeito tranquilizante.

Logo à minha frente, disposta a conversar, está Caroline Alcântara Prates. Para os mais entrosados e/ou admiradores do seu trabalho, ela é Carol Alcântara, a mineira de 29 anos que hoje celebra os sete anos de sucesso do blog Dona Onça. Até que não é nada mal para um projeto que cresceu a partir de um hobby, de acordo com a própria dona.

Carol Alcântara: simples, mas não simplória (Reprodução: Facebook) 

Formada em Relações Públicas e com MBA em Comunicação Digital e Redes Sociais, Carol criou o Dona Onça em 2010, junto a duas amigas, com vista no público feminino. O nascimento da página adveio da insatisfação de Carol com a área de eventos, na qual atuava.

No entanto, com menos de um ano de existência, o blog veio a se tornar responsabilidade única e exclusiva da moça morena, de mechas californianas e olhos castanhos e amendoados.Uma das amigas desistiu por causa dos ofícios acadêmicos, que acabaram se sobrepondo à dedicação ao blog. Já a outra administradora da página abandonou o barco devido à distância. É que ela morava em outro estado e tinha contato com Carol através da rede social Flickr.

Embora tenha passado a segurar a barra sozinha, a blogueira se sentiu mais livre para tratar de outros assuntos. Além de moda e beleza, o Dona Onça abriu espaço para temáticas relacionadas a comportamento, universo fitness e gastronomia.

Mas por que “Dona Onça”? O gosto pela estampa do animal inspirou a criação do nome do blog. E o mais curioso é que a ideia não partiu da mente de nenhuma das criadoras.

- A gente queria alguma coisa que tivesse onça, só que não sabíamos o que - conta Carol, aos risos. O insight veio do namorado de uma das integrantes.

Inicialmente tratado como uma brincadeira, o Dona Onça começou a seguir o rastro de blogs famosos, como “Chata de Galocha”, da designer gráfico Lu Ferreira, e “Eu Maquio”, da maquiadora Ane Medina.

- Eu nem entendia muito de blog, pra te falar a verdade. Mas eu tinha uma conta no Flickr, e lá sempre postava coisas de maquiagem e esmalte. Tinha grupos de meninas que gostavam do mesmo assunto... Teve uma hora que pensei: vou fazer um blog, porque vou falar de assuntos que posso explorar mais. E foi aí que chamei as minhas amigas – explica a blogueira.

A primeira vez ninguém esquece

O espírito empreendedor de Carol não surgiu da noite para o dia. Até então, ela apenas brincava de ser blogueira.

- A primeira vez que senti o blog famoso foi quando uma marca me pediu um media kit, e eu nem sabia o que era isso. O blog não devia ter nem seis meses. Ficamos naquela: e agora? Acabamos criando um de acordo com um modelo que achamos na internet e vimos que isso poderia dar dinheiro.

Do primeiro cliente, Carol e suas amigas receberam pelo serviço um pouco mais que 100 reais. A partir daí, o Dona Onça deixava de ser “modinha” para virar um negócio. Agora, se você quiser contratar o blog, terá acesso a um media kit oficial.

Reconhecimento

O Dona Onça foi a chave que abriu muitas portas na vida de Carol. Por conta do blog, entre os familiares, ela ganhou o status de “famosinha”. Um passeio pelo seu Instagram justifica a alcunha. Atualmente, são mais de 12,5 mil seguidores que acompanham a rotina da beldade belo-horizontina. Eles ficam por dentro do que ela veste, come, lê, ouve,ganha, pratica e até do que sente.

Os posts, em sua maioria recomendativos, expõem experiências da blogueira com produtos, serviços e atividades. Aliás, empresas a contatam para parcerias. Em um dia, ela indica um kit de limpeza de maquiagem da L´Oréal Paris. No outro, ela mostra os brincos de cristais Swarovski que ganhou do BHShopping. Em função do seu trabalho, Carol ainda costuma receber alguns mimos como cremes, acessórios, roupas e esmaltes. Também constam no portfólio dela divulgações para lojas de grife, lanchonetes, restaurantes e até uma rede de drogarias.

Enquanto na mesa ao lado a auxiliar de serviços gerais promove uma sinfonia de tilintares de pratos e talheres, Carol relata que o seu emprego atual foi conquistado graças ao blog. A Link, agência de comunicação, a convocou para a vaga de gerente de mídias sociais. É de sua atribuição na empresa criar conteúdos, como posts e vídeos, e interagir com o público nas páginas dos clientes. Além disso, a blogueira já teve a oportunidade de fazer viagens, participar de megaeventos fashionistas e conhecer celebridades, modelos, estilistas e influenciadores digitais.

À medida que o blog foi ganhando repercussão na internet, Carol começou a sentir algumas mudanças no cotidiano. Eventualmente, ela conhece leitores em situações triviais, como no ônibus ou andando na rua.

- Tem horas que encontro com gente que me fala: “oh, você é aquela moça do blog!” - conta com uma expressão satisfeita.

Germinação da semente

Apesar de circular com frequência em bairros de classe média alta da capital mineira, a essência de Carol vem dos bairros Santo André e Renascença (neste, ela mora até hoje). Em casa, o convívio é 100% matriarcal. Aliás, matriarcal duas vezes: mãe e avó.

Embora tenha referências fortemente maternas, Carol tem poucas lembranças do pai. Ele faleceu devido a uma pneumonia, quando a blogueira tinha seis anos. No entanto, o amor paterno veio do avô e do tio, como lembra a prima Érika Alcântara. “Ela começou a ter nosso avô como pai. Depois de um tempo, ele faleceu, quando tínhamos 18 anos. Aí ela tomou o meu pai como o pai dela”, relata.

Érika diz que aprendeu com Carol o verdadeiro significado da palavra “amizade”. “Desde quando a gente nasceu, sempre morávamos na mesma casa. Ela morava no barracão de trás, e eu, no da frente. Então, ela foi minha primeira amiga. Fazíamos tudo juntas”, relembra.

A amabilidade está no DNA de Carol. Tal premissa é atestada por qualquer um que a conheça. “Ela é superdivertida e alto astral. Não tem como não gostar dela”, observa Mailla Souza, estagiária da Link, supervisionada por Carol há um ano. Para a subordinada, a comunicabilidade é um dos principais cartões de visita da chefa. “Onde ela chega, é extrovertida e conversa com todo mundo”, pontua.

Todavia, a perfeição é uma utopia também para a blogueira. “Até que na organização, ela realmente está melhorando. Na verdade, ela é bem estabanada: quebra e bate em tudo”, diz, sorrindo, a colega de trabalho. Érika também não perdoa e confirma a tendência da consanguínea para a estabanice. “A Carol treinava para não pagar mico. Quando era época de formatura, ela tinha medo de cair, igual à personagem do filme Miss Simpatia. Eu a aconselhava a treinar bastante para evitar esse tipo de situação”, expressa a “conselheira de etiqueta”.

Posso ajudar?

O fato de Carol Alcântara ser uma blogueira com bom trânsito faz com que muitos conhecidos (ou não) a tomem como uma espécie de guru. “Quando o assunto é roupas ou coisas de beleza, quase todos pedem a ajuda dela, pois sabem que ela tem bom gosto”, expressa Mailla, em tom de admiração.

Em matéria de bom gosto, os conhecidos de Carol a julgam como uma lacradora expert (Repdroução: Facebook)

O Dia dos Namorados de Érika Alcântara já foi salvo diversas vezes pela prima. A intuição de Carol para escolher bons presentes é certeira. “Ela sempre foi imaginativa. Gostava de sair do óbvio e inventar coisas diferentes”, descreve a prima acudida, que ainda confessa o ato de conferir os looks nas redes sociais. “As roupas eu olho mesmo! Até procuro saber onde Carol compra!”, acaba se entregando,em meio a risos.

Jéssica Alcântara, outra prima de Carol, relata que o guarda-roupa da blogueira é o sonho de consumo da maioria de suas amigas. Segundo ela, o hábito de ler livros “good vibes” começou a partir da parente. “Eu gosto de ler as mesmas coisas que ela. Às vezes quando posta no blog que está lendo um determinado livro, eu também fico ansiosa para lê-lo”, conta.

O grau de influência de Carol vai além do círculo familiar e de amigos. Érika menciona uma ex-estagiária com quem trabalhou, seguidora do Dona Onça. “Quando ela soube que eu era prima da Carol Alcântara, quase surtou! Disse que por causa dela mudou o modo de vestir, passou a frequentar as mesmas lojas e usava as mesmas maquiagens”, revela.

Bel prazeres

- Amo viajar! Se eu pudesse, viajaria muito mais! – explana Carol, demonstrando tesão pelo hobby.

Símbolo-mor dessa predileção é a Cidade Maravilhosa. Um feriado aqui, um fim de semana ali já é desculpa suficiente para zarpar com as amigas rumo às praias cariocas. De acordo com Jéssica, as idas ao Rio se tornaram mais comuns quando Carol ficou solteira... Pelas fotos paradisíacas nas redes sociais, dá para entender o porquê de Carol amar a capital fluminense.

A falta de tempo e dinheiro é fator impeditivo para que a blogueira conheça lugares novos regularmente. Entretanto, já que as malas de Carol precisam ter paciência e aguardar o momento oportuno para uma viagem, a blogueira se dá ao luxo de sair todos os finais de semana, seja com amigos ou primos. Achá-la em barzinhos ou restaurantes é um clichê. Se o lugar tiver música ao vivo e um público jovem, melhor ainda. Recentemente, Carol também está começando a se render aos festivais gastronômicos.

Uma dica para quem quer conquistá-la: invistam no estômago. Apesar de aparecer nas redes sociais em atividades físicas intensivas, como circuitos e crossfit, Carol não abre mão de comer bem. Qualquer prato lhe soa agradável (destaque para pratos de origem italiana e fast food). Diga-se, exceto batata doce.

Quer entender o que é ecletismo musical? Visualize as playlists de Carol no Spotify. Embora a preferência se centre no sertanejo, é possível encontrar músicas de diferentes vertentes: samba, pagode, rock, funk, axé, marchinhas carnavalescas, MPB...

- Depende do meu estado de espírito no dia– conta Carol, perdida em meio a seus gostos musicais.

Na estante dela, os livros de autoajuda são predominantes. Tais obras, de acordo com a blogueira, ajudam a moldar ou a melhorar sua personalidade. Osho, Sri Prem Baba e Eckhart Tolle são algumas das indicações feitas por ela nas redes sociais. Em matéria de cinema, Carol é atraída facilmente por filmes de guerra e comédias românticas. Para não fazer feio com a blogueira, jamais a chame para assistir longas de terror ou besteirol americano, como American Pie.

Paixão alvinegra

A adoção do tio como figura paterna trouxe algumas influências na vida de Carol. Se hoje a blogueira vai assiduamente ao Mineirão ou Independência provar o seu amor pelo Atlético Mineiro, isso é legado do “pio” (pai + tio). “A primeira vez que ela foi ao estádio ver o Galo jogar foi com o meu pai. Sei que ela ficou apaixonada!”, diz Érika.

Esse episódio fez com que a paixão pelo clube alvinegro tivesse capítulos ainda mais emocionantes. A Taça Libertadores de 2013, campeonato no qual a trajetória do Atlético culminou na conquista do título de campeão, foi o estopim do vício de Carol pelo time mineiro.

Relacionamento sério? Só com o Atlético Mineiro! (Reprodução: Facebook)

O amor de Carol pelo Atlético Mineiro ficará marcado até o fim de sua vida. Uma tatuagem no pulso esquerdo de um pequeno coração alvinegro representa tal fidelidade da jovem. Na medida em que gesticula, a tatoo de Carol se torna mais evidente. O desenho, fruto de uma promessa feita ainda na Libertadores de 2013, só virou realidade após o capitão Réver levantar a taça. Érika também vivenciou esse momento junto à prima. “Nós duas fomos juntas, no mesmo estúdio, fazer as tatuagens. Enquanto ela tatuou o coração com as cores do time, eu fiz uma com a palavra “fé” acompanhada de uma estrela, que significa o título conquistado pelo Galo. Tiramos muitas fotos!”, rememora, em meio às gargalhadas.

Ademais, Érika diz que a aventura foi especial, pois era a primeira vez que ambas ficaram a mercê da agulha de um tatuador. “Estávamos muito nervosas. Eu não sabia se escrevia a palavra “fé” ou se desenhava Nossa Senhora Aparecida como símbolo da vitória. Já a Carol se preocupou em passar pomada para não sentir tanta dor”, recorda, em meio às gargalhadas, a companheira de promessa. A emoção também foi outro sentimento que tomou conta da experiência pra lá de empolgante. “No dia, não aguentamos. Os nossos olhinhos se encheram de lágrimas”, diz Érika, toda derretida. 

* Entrevista produzida em junho de 2017 para uma oficina de perfis do curso de jornalismo do Centro Universitário de Belo Horizonte (UniBH)


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