EDITORIAL - Do gozo ao gonzo

EDITORIAL

Do gozo ao gonzo*

Por Leonardo Amorim

O americano Hunter Thompson foi um jornalista a frente do seu tempo. O jeito singular de noticiar os fatos fez com que ele marcasse a história do jornalismo como criador de um estilo: o jornalismo gonzo. A escrita de Thompson era totalmente subjetiva e rompia com os padrões tradicionais da área jornalística.

Nos anos 60, ele trabalhou como correspondente da revista National Observer, na América do Sul. Logo depois, foi para a Rolling Stone. Um famoso episódio da sua biografia é referente a uma cobertura jornalística que fez sobre a Mint 400, uma corrida de MotoCross no deserto de Las Vegas, nos Estados Unidos. Antes de zarpar para o destino, Thompson encheu o porta-malas do carro com drogas e bebidas alcoólicas.

Na noite anterior ao evento que iria cobrir, o jornalista se dopou através de entorpecentes e promoveu uma baderna no quarto do hotel onde estava hospedado. Resultado? Mal sabia quem tinha ganhado a corrida, pois não fez a cobertura - conforme lhe foi demandado. Seguindo à risca o ditado popular “quem não tem cão, caça com gato”, Thompson escreveu uma matéria completamente subjetiva, com uma visão debochada e irreverente. Ao invés de uma reportagem nos moldes tradicionais da atividade jornalística, Thompson investiu em relatos informais, alucinados e psicodélicos. As narrativas ainda contaram com a companhia de um advogado samoano - igualmente bêbado.

A Sport Illustrated, revista esportiva que encomendou a cobertura de Thompson, não hesitou em rejeitar a reportagem transgressora dos “princípios jornalísticos”. Pois bem, toma lá, da cá: a Rolling Stones – tida na época como a “bíblia da contracultura” - se interessou pelos artigos do jornalista e os publicou em série. Com o sucesso deles, não tardou para que as livrarias recebessem uma obra nada séria e convencional.

Embora as aventuras tresloucadas de Thompson pareçam ser casos desviantes da enrijecida “objetividade jornalística”, elas serviriam como sementes fecundadoras do jornalismo gonzo, cuja premissa beira entre a realidade e a ficção.

Hunter Thompson, pai do "rebelde"e "contraventor" jornalismo gonzo

A partir dessa explanação sobre o jornalismo gonzo, lanço uma reflexão: não seria esse um bom caminho para a redenção da imprensa mineira?

A liberdade de expressão entre os jornalistas de Minas Gerais não é tão democrática o quanto se pensa. Diga-se de passagem, mais especificamente na gestão do ex-governador Aécio Neves. São muitos os profissionais que reclamam da dificuldade que se tem para divulgar informações relacionadas ao governo tucano. Até Dilma e Lula já declararam publicamente que a imprensa mineira é “dócil” com o presidenciável do PSDB.

Tem-se conhecimento de alguns casos de jornalistas que perderam o emprego por exercerem o direito à liberdade de expressão. O Sindicato do Jornalistas Profissionais de Minas Gerais (SJPMG), por meio de pesquisas, reconheceu um número significativo de reclamações no que diz respeito a ser jornalista no governo de Aécio Neves, já que ele e sua irmã, Andrea Neves, são acusados de fiscalizarem e manipularem o trabalho da categoria.

Usar da ousadia do jornalismo gonzo seria uma alternativa de mostrar que existem profissionais independentes e competentes, dispostos a levarem a verdade dos fatos para a sociedade. A imagem de Hunter Thompson é sugerida como símbolo de um jornalismo renovado. Para a imprensa mineira, tal modelo jornalístico é a carona perfeita rumo à libertação da censura e manipulação tucana.


*Originalmente, esse texto foi elaborado em setembro de 2014 durante o curso de jornalismo no Unibh. No entanto, devido o momento atual da política brasileira, diga-se, os escândalos de corrupção envolvendo o senador Aécio Neves (PSDB) e sua irmã Andrea Neves, - essa última inclusive chegou a ser presa em uma das operações da Lava Jato, a Patmos, deflagrada em 18 de maio - achei válido “ressuscitar” esse editorial produzido com intuito acadêmico. Para esta postagem, o conteúdo foi reescrito.


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