CRÔNICA
O
jogo virou
Por Leonardo Amorim
A maioria das pessoas afirma que gatos são
mais frios e insensíveis em relação aos cachorros. E só pra não dizer que estou
me baseando no achismo do populacho, pesquisas científicas já se deram o
trabalho de comprovar isso: gatos são apáticos, solitários e individualistas.
Se em sua forma genérica o bichano já é malquisto, imagine se ele for preto...
Aliás, essa cisma de olhar torto os felinos
que produzem muita melanina é algo histórico. Em um tempo no qual sexo era
pecadoe milhares de europeus morriam pela peste bubônica, os gatos pretos
receberam o carma de desgraçados. Essa implicância surgiu em virtude de fofocas
medievais que diziam que os gatos pretos eram bruxas transformadas. Haja
imaginação para esse povo da Idade Média! Talvez fosse pela falta literal de
sexo.
Como todos sabem, informações provenientes de boataria ganham uma
conotação pra lá de credível. Não demorou muito para que o felino ardesse nas
“santas” fogueiras da Inquisição junto as suas donas. Eis os primórdios do
“churrasquinho de gato”? Acho que a origem dessa expressão é menos cruel e
explícita. Sobre ter gatos pretos como animais de estimação na Idade das
Trevas, era a prova viva de pacto com Satanás. Deus te livrasse se alguém o
pegava brincando com um!
O folclore, por meio das superstições,
perpetuou no imaginário dos crédulos o mito de que gatos pretos são sinônimos
de mau agouro. Na cultura popular, sexta-feira 13 e o animal são equivalentes. Durante
essa data, miados uníssonos em cemitérios e encruzilhadas são sinais de suplício
dos pobrezinhos.
As narrativas de terror pouco se lixam para
os direitos dos animais. Em “O Gato Preto” (1843), Edgar Allan Poe se
aproveitou do estigma de azarento do bichano para responsabilizá-lo por uma
série de fatos bizarros. Também me recordei da série global Supermax, que há pouco tempo, exibiu
imagens de um gato preto sendo sacrificado em um ritual de magia negra.
Apesar da crença estapafúrdia de que gatos
pretos são seres ocultos e dão azar, as recentes eleições na Holanda podem ser sinais
de outros tempos para o bichano. Li há poucos dias sobre um gato preto que roubou as atenções ao aparecer em uma foto de campanha de um candidato da extrema-direita. Dias depois do registro, o político, que era
favorito ao pleito de primeiro-ministro, perdeu a disputa. Foi aí que comecei a
elaborar a minha teoria conspiratória.
Sobre o derrotado, descobri que é uma erva
daninha da espécie Donaldys Trumphis, esta
ainda não bem compreendida. Perdoem-me
a falta de educação, mas esqueci de tratá-lo pelo nome: Geert Wilders. Confesso que até algumas semanas atrás, tal pessoa era tão desconhecida para mim quanto Game of Thrones. Uma googlada resolveu: luta pelo fim da islamização da Holanda e pela entrada de imigrantes no país. Em um tom sensacionalista, à la Nelson Rubensm revela-se o bafo: tem raízes lá na Indonésia, um país do sudeste asiático! A pose de magnata de extrema-direita e os cabelos louros jogam para debaixo do tapete o antepassado indonésio por parte de mãe.
Não sei se o “Trump holandês” culpou o
bichano fotogênico pela derrota nas urnas, mas penso que o pet trouxe uma sorte diferente para a galera dos Países Baixos, que
se livraram de uma praga islamofóbica e xenófoba. Nesse tipo de sorte, eu
prefiro acreditar. Muçulmanos e imigrantes, um gato preto acabou de abrir as
portas da Holanda para vocês. Sejam bem-vindos!
Por telepatia, temeroso, o gato me disse: "Sério que eu tive que passar por esse constrangimento?" (Reprodução: G1)
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